Revista Poetizando

13.9.08

POETIZANDO Nº. 30
(Edição de Primavera)


ROSA

Rosa colhia sozinha
Lindas rosas no jardim
E nas faces também tinha
Duas rosas de carmim.

Cheguei-me e disse-lhe: Rosa
Qual dessas rosas me dás?
As da face primorosa
Ou essas que unindo estás?...

Ela fitou-me sorrindo,
Ainda mais enrubesceu;
Depois, ligeira fugindo,
De longe me respondeu:

"Não dou-te as rosas das faces
Nem as que tenho na mão:
Daria, se me estimasses,
As rosas do coração."

AFONSO CELSO
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AUTORES DO MÊS

Setembro

AUTA DE SOUZA, poetisa brasileira, nasceu em Macaíba/RN em 12 de setembro de 1876 e faleceu em Natal/RN em 7 de fevereiro de 1901. De linguagem muito simples, direta, comunicativa e mística produziu uma obra de profundo sentimento religioso. Seu texto aproxima-se muito do Simbolismo, sendo descoberto pelos críticos católicos.
Obra: Horto (1900)

CANTIGA

Meu sonho dourado e leve,
que buscas tu a voar?
Um ninho branco de neve
onde me deixem cantar.

E em busca das nuvens belas
lá vai meu sonho a cantar...
Meu sonho cor das estrelas,
meu sonho cor do luar.

Pergunto ao sonho, chorando:
Por que foges a cantar?
E ele responde, cantando:
Porque não quero chorar.

E em busca das nuvens belas
foi-se meu sonho a cantar...
Meu sonho cor das estrelas,
meu sonho cor do luar.
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Outubro

ÁLVARO DE CAMPOS, heterônimo de Fernando Pessoa, poeta português, segundo o autor "nasceu em Tavira no dia 15 de outubro de 1890 (à 1:30 da tarde, diz-me o Ferreira Gomes; e é verdade, pois foi feito o horóscopo para essa hora, está certo), é alto (1,75 de altura, mais dois centímetros do que eu), magro e um pouco tendente a curvar-se, cara raspada, entre branco e moreno, tipo vagamente de judeu português, cabelo, porém, liso e normalmente apartado do lado. (...) Como escrevo em nome desses três? (...) Campos quando sinto um súbito impulso para escrever e não sei o quê."
Algumas Obras: Ultimatum (1917), Aviso por Causa da Moral (1923).

ÀS VEZES

Às vezes tenho idéias felizes,
Idéias subitamente felizes, em idéias
E nas palavras em que naturalmente se despegam...

Depois de escrever, leio...
Por que escrevi isto?
Onde fui buscar isto?
De onde me veio isto? Isto é melhor do que eu...
Seremos nós neste mundo apenas canetas com tinta
Com que alguém escreve a valer o que nós aqui traçamos?...

ÁLVARO DE CAMPOS
in: Ficções do Interlúdio
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Novembro

JOHANN FRIEDRICH von SCHILLER, dramaturgo e poeta alemão, nasceu em Marbach, Württemberg, a 10 de novembro de 1759 e faleceu em Weimar a 9 de maio de 1805. Estudou medicina na Academia Militar de Stuttgart lendo Klopstock, Rousseau e Shakespeare. Não agüentando a disciplina militar, fugiu da escola fixando-se em Weimar. Em 1794 começou amizade com Goethe, que divulgou seu trabalho. Na evolução da literatura alemã ocupa um lugar de primeira ordem. Apesar de não ser poeta lírico, foi brilhante orador em versos. Suas peças provocaram entusiasmo revolucionário aprofundando suas convicções políticas. Algumas Obras: Os Bandoleiros (1781), A Conspiração de Fiesco em Gênova (1783), Intriga e Amor (1784), Don Carlos (1787), Poesias (1800 – 1803), Wallenstein (1800), Maria Stuart (1801), A Donzela de Orleans (1802), A Noiva de Messina (1803), Wilhelm Tell (1804).

ODE À ALEGRIA (fragmentos)

Oh amigos, mudemos de tom!
Entoemos algo mais prazeroso
E mais alegre!
(...)
Tua magia volta a unir
O que o costume rigorosamente dividiu.
Todos os homens se irmanam
Ali onde teu doce vôo se detém.
Quem já conseguiu o maior tesouro
De ser o amigo de um amigo,
Quem já conseguiu uma mulher amável
Rejubile-se conosco!
Sim, mesmo se alguém conquistar apenas uma alma,
Uma única em todo mundo.
(...)
Alegrias bebam todos os seres
No seio da natureza:
Todos os bons, todos os maus,
Seguem seu rastro de rosas.
(...)
Abracem-se milhões!
Enviem este beijo para todo o mundo!
(...)
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HINO

Em sentido literário, o hino pode ser definido como um poema ou cântico lírico de invocação e adoração, exprimindo os mais altos sentimentos. Celebra uma divindade, um personagem ilustre, fenômeno da natureza ou algo notável. Em suas origens, ele está vinculado ao culto religioso, tanto no Ocidente como no Oriente, associando-se ao canto ou dança.
Alguns autores: Homero, Píndaro, Calímaco, Cleanto, Mesômedes, Tertuliano, Eusébio.


HINO À DOR

Dor, saúde dos seres que se fanam,
Riqueza da alma, psíquico tesouro,
Alegria das glândulas do choro
De onde todas as lágrimas emanam. . .

És suprema! Os meus átomos se ufanam
De pertencer-te, oh! Dor, ancoradouro
Dos desgraçados, sol do cérebro, ouro
De que as próprias desgraças se engalanam!

Sou teu amante! Ardo em teu corpo abstrato.
Com os corpúsculos mágicos do tato
Prendo a orquestra de chamas que executas. . .

E, assim, em convulsão que me alvoroce,
Minha maior ventura é estar de posse
De tuas claridades absolutas!

AUGUSTO DOS ANJOS
in: Outras Poesias
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LETRAS

LUA BRANCA

Ó lua branca de fulgores e de encanto,
Se é verdade que ao amor tu dás abrigo
vem tirar dos olhos meus, o pranto
Ai vem matar essa paixão que anda comigo,

Ai! Por quem és, desce do céu, ó lua branca
Essa amargura do meu peito, ó vem e arranca
Dá-me o luar da tua compaixão
Ó vem, por Deus, iluminar meu coração.

E quantas vezes lá no céu me aparecias
A brilhar em noite calma e constelada,
A sua luz então me surpreendia
Ajoelhado junto aos pés da minha amada

Ela a chorar, a soluçar, cheia de pejo
Vinha em seus lábios me ofertar um doce beijo...
Ela partiu, me abandonou assim
Ó lua branca, por quem és, tem dó de mim!...

CHIQUINHA GONZAGA


Obra composta em 1911, traz a união da suavidade da melodia com a letra simples, produzindo um dos mais belos momentos da Música Popular Brasileira.
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HERMANOS

ADIÓS, RÍOS; ADIÓS, FONTES; (fragmento)

Adiós, ríos; adiós, fontes;
adiós, regatos pequeños;
adiós, vista d'os meus ollos,
non sei cándo nos veremos.

Miña terra, miña terra,
terra donde m'eu criei,
hortiña que quero tanto,
figueiriñas que prantei.

Prados, ríos, arboredas,
pinares que move o vento,
paxariños piadores,
casiñas d'o meu contento.

Muiño d'os castañares,
noites craras d'o luar,
campaniñas timbradoiras
d'a igrexiña d'o lugar.

Amoriñas d'as silveiras
que eu lle daba ô meu amor,
camiñiños antr'o millo,
¡adiós para sempr'adiós!

¡Adiós, gloria! ¡Adiós, contento!
¡Deixo a casa onde nascín,
deixo a aldea que conoço,
por un mundo que non vin!

Deixo amigos por extraños,
deixo a veiga pol-o mar;
deixo, en fin, canto ben quero...
¡quén puidera non deixar!

ROSALÍA DE CASTRO
Poetisa Galega
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MULHER

COMO TE AMO?

Como te amo? Deixa-me contar de quantas maneiras.
Amo-te até ao mais fundo, ao mais amplo
e ao mais alto que a minha alma pode alcançar
buscando, para além do visível dos limites
do Ser e da Graça ideal.
Amo-te até às mais ínfimas necessidades de todos
os dias à luz do sol e à luz das velas.
Amo-te com liberdade, enquanto os homens lutam
pela Justiça;
Amo-te com pureza, enquanto se afastam da lisonja.
Amo-te com a paixão das minhas velhas mágoas
e com a fé da minha infância.
Amo-te com um amor que me parecia perdido - quando
perdi os meus santos - amo-te com o fôlego, os
sorrisos, as lágrimas de toda a minha vida!
E, se Deus quiser, amar-te-ei melhor depois da morte.

ELIZABETH BROWNING


ELIZABETH BARRETT BROWNING, poetisa inglesa, nasceu em Coxhoe Hall, perto de Durham, a 9 de março de 1806 e faleceu em Florença a 29 de julho de 1861. Produziu uma das melhores poesias da Inglaterra. Foi casada com o poeta Robert Browning.
Algumas Obras: Janelas da Casa Guidi (1851), Aurora Leigh (1856), Poemas antes do Congresso (1860).
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POETAS PORTUGUESES

SONETO

Que suspensão, que enleio, que cuidado
É este meu, tirano Cupido?
Pois tirando-me enfim todo o sentido
Me deixa o sentimento duplicado.

Absorta no rigor de um duro fado,
Tanto de meus sentidos me divido,
Que tenho só de vida o bem sentido
E tenho já de morte o mal logrado.

Enlevo-me no dano que me ofende,
Suspendo-me na causa de meu pranto
Mas meu mal (ai de mim!) não se suspende.

Ó cesse, cesse, amor, tão raro encanto
Que para que de ti não se defende
Basta menos rigor, não rigor tanto.

VIOLANTE DO CÉU


VIOLANTE DO CÉU, nome adotado como freira dominicana por Violante Montesino, poetisa que nasceu em Lisboa em 1601 e faleceu na mesma cidade a 21 de janeiro de 1693. Tornou-se freira em 1630, Sua arte poética tinha grande poder verbal, intelectualizando temas líricos com grande sinceridade.
Algumas obras: Rimas (1646), Parnaso Lusitano de Divinos e humanos Versos (1733).
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ERÓTICA

NA PENUMBRA

Raiava, ao longe, em fogo a lua nova,
Lembras-te? . . . apenas reluzia a medo,
Na escuridão crepuscular da alcova
O diamante que ardia-te no dedo. . .

Nesse ambiente tépido, enervante,
Os meus desejos quentes, irritados,
Circulavam-te a carne palpitante,
Como um bando de lobos esfaimados...

Como que estava sobre nós suspensa
A pomba da volúpia; a treva densa
Do teu olhar tinha tamanho brilho!

E os teus seios que as roupas comprimiam,
Tanto sob elas, túmidos, batiam,
Que estalavam-te o flácido espartilho!

RAIMUNDO CORREIA

RAIMUNDO DA MOTA AZEVEDO CORREIA, poeta brasileiro, nasceu em um navio na baía de Mogúncia/MA a 13 de maio de 1860 e faleceu em Paris a 13 de setembro de 1911. Formou um dos grupos mais fortes da poesia parnasiana brasileira. Algumas obras: Primeiros Sonhos (1879), Sinfonias (1883), Versos e Versões (1887), Aleluias (1891).
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FOLK-LORE

O fato mais característico do folclore santista é a Fonte do Itororó, que existia no sopé do Monte Serrat, perto do início da escadaria. Há séculos ela era procurada por sua água límpida e cristalina que brotava da rocha. Enquanto Santos não tinha serviço de abastecimento, a bica do Itororó servia o povo. Ela tornou-se lendária, pois diziam que quem bebesse de sua água não deixaria mais a Cidade. A biquinha do Itororó ficou tão famosa, que a Prefeitura mandou urbanizá-la. Tempos depois ela secou. Mas ficou eternizada na cantiga de roda, que ainda hoje se escuta na boca do povo.


Recorde-a:

Fui a Itororó
Beber água e não achei
Achei bela morena
Que no Itororó deixei

Aproveite minha gente
Que esta noite não é nada
Se não dormir agora
Dormirá de madrugada.
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LENDAS INDÍGENAS

MIRIXORÃS

Mirixorãs, são as prostitutas existentes nas tribos de índios brasileiros. Elas são escolhidas entre as meninas mais bonitas – duas ou três cada geração. São consagradas numa linda cerimônia, não podem mais se casar. São mulheres de todos, são mulheres de ninguém, são mulheres de si mesmas, porque se fazem desejadas por todos os homens. Elas não causam ciúmes nas mulheres casadas. Ao contrário. Em certas épocas elas aconselharão os maridos a procurarem as mirixorãs que serão boas e carinhosas com eles.
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SOBRE FÁBULA

A fábula é um dos jeitos mais antigos de contar estórias! Foram descobertos vários registros no Egito e na Índia, em livros sagrados como o Pantchatantra, que é escrito em sânscrito e em livros que revelavam os segredos do sucesso na vida política, como Calila e Dimna. Do Oriente para o mundo ocidental, vamos ter Esopo - o nome do mais famoso fabulista. Outro nome bem conhecido é Jean de La Fontaine - mas esse é bem mais "moço", nasceu na França, em 1621. Agora, entre um e outro, entre Esopo e La Fontaine, existiram muitos outros homens interessados na Fábula - e, é claro, depois deles também. As fábulas querem dizer e dizem muito em poucas linhas. Podem ser em prosa ou em versos; seu título apresenta de imediato os personagens que tomarão parte da trama e a gente pode, assim, imaginar o conflito que está para acontecer. É da fábula que nasce "a moral da estória" - na verdade, um conselho ou um julgamento sobre os fatos que acontecem na vida que nos é dado pelo narrador.
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No dia 12 de setembro, junto com o lançamento da revista literária artesanal POETIZANDO nº. 30, houve também a apresentação do novo livro da poetisa e artista plástica EUNICE MENDES: CERIMÔNIA DAS FLORES. Segue um poema desse trabalho que dá título ao livro.

CERIMÔNIA DAS FLORES

eu era a menina
que todas as tardes
sentava no muro do jardim
e oferecia uma flor
a quem passasse no meu portão

tinha em mãos
um grandioso bouquet
de margaridas
cravos
rosas
violetas
lírios amarelos
e bocas de leão

fossem homens ou mulheres
crianças ou velhos
ricos ou pobres
eu lhes dava uma flor
do meu jardim
e recebia sorrisos
coroados de sol;
alguns, surpreendidos,
não compreendiam de imediato
a singeleza do gesto
e me olhavam atordoados e inquietos

- a flor insistia em minhas mãos

eu era a mensageira das flores
que todas as tardes
sentava no muro de casa
e celebrava a vida com esperança
nada sabia das outras vidas
e isso me fascinava
porque cada uma delas
não era eu
havia uma intensidade
nos seus universos desconhecidos
que me encantava e embevecia
como se inconsciente soubesse
que só me completaria ali: no outro

queria que aquelas mãos desconhecidas
apenas se estendessem para as minhas
e simplesmente recebessem
o que lhes ofertava com alegria

entre mim e o outro
coloquei uma flor:
- ponte e convite

com o passar do tempo
as flores foram se tornando outras coisas
mas a intenção do gesto persistia
a mão gratuita estendida
ofertando possibilidades

as mãos brancas e finas
de dedos longos e magros
mãos cheias de anéis
mãos que desenhavam
e faziam bordados
teciam flores de papel
e passarinhos de barbante
mãos que escreviam
pareciam de menina ainda
de unhas curtas e pequeninas
pintadas de dourado
pintadas de branco pérola
mãos que recortavam
coloriam
construíam coisas inúteis
- as mesmas mãos das flores

mãos que tanto pediam
cartas
conchas
caixas
a se tornarem
pássaros
nuvens
peixes

as mesmas mãos das flores
fazem do antigo gesto um poema:
ponte e convite

- a flor insiste em minhas mãos
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NOVOS

RESTOS

Tudo o que em mim há muito já não sinto
- dor ou prazer, ânsia de morte ou vida -
persigo em meu interno labirinto,
para levar bem rápido à saída...

O que já não afirmo ou já não minto,
e o ego já não crê nem já duvida
- frações sem uso do apagado instinto
ou partes mortas da razão perdida -

já não me servem, pois são trastes fúteis.
Como algo que parou de funcionar,
são sentimentos para sempre inúteis.

Como tantos restos em minha alma escura,
vou procurar-me sem jamais me achar
ou encontrar-me sem qualquer procura.

SÉRGIO BERNARDO
Nova Friburgo/RJ
in: Caverna dos Signos
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DESPERDÍCIO

O POEMA
QUE SE PERDE
NO CLÍMAX DO INSTANTE
É COMO UM LIVRO ESQUECIDO
ABANDONADO
QUE VAI MOFAR NA ESTANTE

CARLOS CASSEL
Caçapava do Sul/RS
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SONETO SETENTISTA

Setenta foi a década do escuro,
contra a liberação que a precedia.
Enquanto a precedente foi do dia,
a ditadura atinge o grau mais duro.

Regime militar detrás do muro
da lei de segurança e covardia.
Cercada, a intelligentsia se escondia,
e o cidadão pensava estar seguro.

Não me exilei, mas fiz oposição
dum modo panfletário original,
mistura de vanguarda com calão.

Fanzine de poesia marginal
foi precursor da mídia, desde então,
no que esta tem de forma e de informal.

GLAUCO MATTOSO
São Paulo/SP
in: Paulisséia Ilhada – Sonetos Tópicos
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VIGÍLIA

Quando a vida
Tomba
Tomba
Tomba
Pietà
em meus braços
De
caída
Plena
em pleno
cansaço
Oh
não
adormeço
(a morte
espreita
meus passos)

RICARDO ALFAYA
Rio de Janeiro/RJ
in: Rios (Coletânea de Poemas)
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NA ARQUITETURA do amor
és mais do que cornija
Não te abandonas
como ninho ausente
de não dormidas andorinhas

Provocas
o humilde ventre
e os seios indetidos

Nem sequer
na divina corrida
ficas quieta
olhando para o céu

No entanto
na geometria
aparentemente fria
das colunas vivas
és uma cornija

Mas voas
um céu interior
onde os ventos
são presos
na posse.

ANDERSON DE ARAÚJO HORTA
(1906 – 1985)
Brasília/DF
in: Invenção do Espanto
Edições Galo Branco
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CÉU FASHION

O vento acabara de pentear as nuvens,
Quando olhei o céu.
Dois pássaros serviam de presilhas.

MADÔ MARTINS
Santos/SP
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DESA(R)MADO

Vou desa(r)mado
ao teu encontro
sem risos
sem festas.

Com sal
nos olhos cansados.

Levo sob os ombros
escombros de sonhos.
Cidades devastadas
dentro de mim.

RICARDO MAINIERI
Porto Alegre/RS
in: www.mainieri.blogspot.com
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PARADOXO

Sentimento, amor, é utopia
Nesta era de feras fabricadas.
Isto é coisa somente de poesia,
Deletério de vidas fracassadas.

Nesta era de impulsos bestiais,
Onde o amor é o escudo dos vencidos,
Ser forte é ter olhos glaciais,
Ser fraco é ter olhos distraídos.

Ser forte é calçar umas botinas,
Portar em cada mão uma granada
E o coração na ponta de uma espada.

Ser fraco é deitar-se nas campinas,
Sem se importar se existem duas Chinas,
E doido amar uma mulher amada!

LUIZ ANTÔNIO MARTINS PIMENTA
(1942 – 2004)
Santos/SP
in: Antologia Poética
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TROVAS

Não há quem se esforce à toa,
é rotina o desafio,
sendo a vida uma canoa
que atravessa o grande rio.

*

Se na aflição se padece,
busque em Deus a solução...
A calma do céu nos desce,
no intercâmbio da oração.

FERNANDO VASCONCELOS
Ponta Grossa/PR
in: Gotinhas de Orvalho
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MINOTAURO

para Guido Guerra

Na casa de Asterion
mitos e belas donzelas tramam
contra o Amor.

Esfaqueado,
Teseu perambula
entre
muralhas
inutilmente lúcido.

CLEBERTON SANTOS
Feira de Santana/BA
in: Lucidez Silenciosa
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Do alto das torres do tempo as nuvens observam
Languidamente o anônimo passar dos dias
E dos homens.

Moldam-se em ondas alucinadas
Redesenham figuras no espaço
Sobre os autômatos caminhares humanos.

Formam ursos, carros, totens,
As nuvens e seu destino
De parecer o que não são

Como os homens.

BENILSON TONIOLO
Campos do Jordão/SP
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SAL MORA

Meu pote velho de sal.
Velho, até que se quebre.
Açúcar não colocaram
no bojo de tuas entranhas.

No rosa, branco, marrom
moldaram flores barrocas.
Destino, ser doce ou salgado!
Mistério insondável da vida.

De insetos te protegendo
dois parafusos sustentam
a tampa da árvore já morta,
na placa "sal", que enferruja.

Meu pote velho!
Comerás muitos sacos de sal
e abrigarás a salmoura
por seres sua morada.

Velho sal!
De colher em colher
te doas... mas tornam
a salgar o pote.

Pote velho, pote velho,
mãos sem forças
que te enroscam,
esquecidos do mel.

O homem segura o pote.
Os deuses seguram o homem.
De sal igualmente contidos
desmanchando-se na mesma sorte.

Da água ambos vieram,
na água eles se dissolvem,
e a terra é que engolirá
a amargura dessas vidas.

TERESINHA TADEU
(1941 – 2001)
Santos/SP
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MANIA

Pelo tempo que me resta,
vocês terão que agüentar:
esta mania cantadeira
composições
versos livres
Não consigo me calar.

A inspiração me persegue
em qualquer canto ou lugar.
Já nem sei onde me encontro.
Sei que posso imaginar.

E monto nesse cavalo
galope alago, sem parar.
Presa nas crinas do sonho,
canto livre pelo ar!

A poesia corre solta.
Invade casas, jardins.
Senta no banco da praça
- ao meu lado. Nunca se afasta de mim.

Vou escrevendo pelo mundo afora:
vento água areia...
- qualquer vão. Até emudecer meu canto
e calar meu coração.

REGINA ALONSO
Santos/SP
___________

POEMA QUASE TEOLÓGICO

Cansaço
deste cansaço. Deste
fitar horizontes fechados,
crernãocrer para lá do paredão de treva
imensidades lúcidas. Cansaço:
peixe no mar do inumerável,
adstrito ao zero da esfera. Cans-
aço: casulo no infinito,
não rompê-lo. Prévio
cansaço
do inútil arranhar o espaço, - o tempo
incólume.
No tempo
erguem-se decisivas as muralhas da treva.

ANDERSON BRAGA HORTA
Brasília/DF
in: Cronoscópio
Civilização Brasileira/Pró-Memória
Instituto Nacional do Livro
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PAZ

As pombas comeram milho
nas mãos do mendigo purulento.
Pombas sem fel.
Quanta ironia!
Comeram o milho e, agradecidas,
deixaram em sua pele
a virose agressiva e fatal
que aos poucos levou
ao panteão imortal
seus ossos de milho.

NEIVA PAVESI
Santos/SP
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flamboyant

Nem palavra nem árvore. Flamboyant é bote, boiando acima da tarde.

˚
No período de floração, flamboyant é flama. Convém manter as crianças à distância. Os amantes nem tanto.

˚
Flamboyant cresce à margem do dicionário. Parce que il ne parle pas, il flambe.

FERNANDO FÁBIO FIORESE FURTADO
Juiz de Fora/MG
in: Dicionário Mínimo
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DESCOBERTA

Final de tarde.
Pelas alamedas verdes
vou caminhando triste,
solitária de mim,
numa tristeza de final de primavera,
de mudança de tempo,
de saudade.
Os olhos grudados ao chão,
sem rumo,
vou simplesmente caminhando...
Remoendo a tristeza de ser triste.
A noite
ligo a televisão e percebo
na pauta de um jornal, a repórter
mostrando o viço dos roseirais,
das palmeiras,
das margaridas, enfim,
da beleza majestosa que emoldura
as alamedas onde passeei minha tristeza.
Naquele instante
dei-me conta que a vida,
abraçada a mim naquele trajeto,
tentava me trazer de volta.

DALVA DE ARAÚJO
Santos/SP
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O POSSÍVEL DA MEDIDA

Retocar
a seiva
do verbo.

Reflectir
no oculto
da face.

Retirar
o sentido
da rima.

Reservar
o rebordo
da espera.

Remeter
à farsa
da fala.

Recear
o toque
no seio.

Reportar
ao trauma
do signo.

Restringir
na proporção
do medo.

Requerer
o oposto
da questão.

E repesar
o possível
da medida.

FERNANDO AGUIAR
Lisboa/Portugal
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para minha vó

ainda dou meu tempo aos jardins
e espero os brotos dos jasmins
no mês de maio
cobrir o chão de estrelas brancas
para em minhas mãos virar perfume
depois de secas em sachês bordados

minha vó também recolhia
as pequeninas flores perfumadas
e entre as suas mãos guardava
o encanto infantil de as ter juntado

agora estou sozinha em seu jardim
e as mãos dela às minhas
parecem haver se acrescentado
a mesma esperança
adormecida nas flores do jasmim
sonha acordada em mim
feito estrelas brancas perfumadas

EUNICE MENDES
Santos/SP
in: Cerimônia das Flores
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DUNAS III

A Luiz Antônio Martins Pimenta

Não sou um tiranossauro dos poemas.
Só quero exprimir o que sinto.
Não quero que tapem minha boca, nem esquemas.
Quero dizer verdades, não minto.

Vamos arrasar os malfeitores,
os que corrompem os poetas juvenis,
não daremos tréguas aos salteadores,
que habitam nos brasis.

Marcharemos companheiros, sem temor.
Versejando na terra da inspiração
e no soneto alado da canção!

Porque o pó fétido do mal amado
pulveriza o poema de amor,
mas no fim ele morre, acabado.

WALMOR DARIO SANTOS COLMENERO
São Vicente/SP
in: Tributo Vivo
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ANSIEDADE

Sentir na boca e na barriga
a emoção que sente,
toda noite,
a mulher do atirador de facas.
Até que a angustia da espera
cresça tanto
que o desvio da arma
passa a ser desejado.
Mas se teima a destreza
em ser milimétrica
no perfil,
vai o corpo de encontro
à rota determinada.
Como se fosse inexorável
morrer de medo
ou de coragem.

SERGIO ANTUNES
São Paulo/SP
in: www.sergioantunes.art.br
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Segredo é uma coisa
que se conta
para poucas pessoas

e essas poucas pessoas
contam para outras
poucas pessoas

e essas outras
poucas pessoas
só contam para algumas
poucas pessoas

Segredo é uma coisa
que muitas pessoas
podem ficar sabendo

DINOVALDO GILIOLI
Florianópolis/SC
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SONETO DO MAR

E me é doce olhar tuas águas
e enxergar nelas uma luz latente
azul e verde, simultaneamente:
nestas cores afogo minhas mágoas.

Esqueço da vida os dissabores
e me encontro comigo próprio
sem precisar de qualquer ópio
só me enxergando nas tuas cores

Sinto que o amor fica muito perto
quando bem perto eu fico do mar
E você, quando vem me encontrar?

para este amor fica mais certo
para este amor se consumar
no brilho, no sal, nas cores do mar.

MARCELO LOPES
Guarujá/SP
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Sobre a areia e o mar
Passeia a lua tão cheia
Dando paz demais

*

Sobre os prédios altos
Reflete a lua de prata
Seu manto de luz

*

Se vem hoje o amor
Prometo à lua no céu
Amá-lo prá sempre

NEUSA MARIA CONFORTI SLEIMAN
Santos/SP
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MAR

Eu te reverencio pela doce provocação com tuas ondas inquietas, que insistentemente me vêm beijar os pés na branca areia da praia.
Eu te reverencio por embalares com a canção de tuas ondas, os pescadores com suas jangadas, no leito de tuas águas, para buscarem o seu pão de cada dia.
Eu te reverencio por trazeres tantos irmãos de tantos outros lugares que procuram a realização de seus sonhos.
Eu te reverencio por teus mistérios, tua magia, teu poder e tua beleza, com esse azul refletido da imensidão do céu.

DEISE DOMINGUES GIANNINI
Santos/SP
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INFORMAÇÃO IMPORTANTE

Além das seções da revista POETIZANDO
e dos novos poetas,
você poderá encontrar na revista impressa:
Frases, Prosa, Biografias, Crônica, Conto,
Estilos de Época e muita poesia...

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OUTRAS PUBLICAÇÕES DO SELO ARTESANIA

LIVROS:

De Eunice Mendes:

* Cerimônia das Flores
* Flores e Frutos
* Sonhares
* Aurora Gris
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* Sino dos Ventos
* Lua na Janela
* Espaços do Vazio
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De Walmor Dario Santos Colmenero:

* Um Poeta na Rua
* Memórias
* Versos Vivos
* Das...
* O Homem Natural
* A Mulher Natural
* Poeminhas
* Proverbinhos
* Expressões Impressas
* Bagagens de Ontens
* Poemas Bluseiros
* Tributo Vivo
* A Multiplicação do Nada
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FOLHAS POÉTICAS:

A Poetisa
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Editora: Eunice Mendes
O Poeta
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Editor: Walmor Dario Santos Colmenero
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FANZINES:

Árvore Azul (7 edições)
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Escritos - Modelo: Oficio 9, 4 páginas, edição bimestral.
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