Revista Poetizando

14.6.09

POETIZANDO Nº 33
(Edição de Inverno)


PAISAGEM OUTONO – INVERNO

Foi rápido como as horas não percebidas
como o pensamento
Amanheceu folhas no chão
Coisas inesperadas do vento
chegou de mansinho
Sacudiu Fugiu

É o tempo

CARLOS CASSEL
Caçapava do Sul/RS
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AUTORES DO MÊS


JUNHO

ANTONIO DUARTE GOMES LEAL, poeta português, nasceu em Lisboa a 6 de junho de 1848 e faleceu na mesma cidade a 30 de janeiro de 1921. Seus poemas apontavam um caminho simbolista aparecendo nos jornais em 1866. Já em 1869, seu nome já aparecia como "poeta novo" ao lado de Teófilo Braga, Antero de Quental e Guerra Junqueiro. Foi poeta folhetinesco, panfletário e satírico, usando como temas a filosofia, a política e a religião.
Algumas Obras: Claridades do Sul (1875), História de Jesus (1883).

O VISIONÁRIO OU COR E SOM

2

Alucina-me a cor! – A rosa é como a Lira,
a Lira pelo tempo há muito engrinaldada,
e é já velha a união, a núpcia sagrada,
entre a cor que nos prende e a nota que suspira.

Se a terra, às vezes, brota a flor, que não inspira,
a teatral camélia, a branca enfastiada,
muitas vezes, no ar, perpassa a nota alada
como a perdida cor dalguma flor que expira...

Há plantas ideais de um cântico divino,
irmãs do oboé, gémeas do violino,
há gemidos no azul, gritos no carmesim...

A magnólia é uma harpa etérea e perfumada,
e o cacto, a larga flor, vermelha, ensanguentada,
– tem notas marciais, soa como um clarim.

in: Claridades do Sul
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JULHO

EMÍLIO DE MENESES, poeta brasileiro, nasceu em Curitiba/PR a 4 de julho de 1866 e faleceu no Rio de Janeiro a 6 de junho de 1918. Grande boêmio e satírico, transferiu-se para o Rio de Janeiro escrevendo crônicas para os jornais em que satirizava as figuras célebres da época. Aderiu ao Parnasianismo, produzindo rimas raras, contudo, sua importância maior foi como satírico. Depois de duas tentativas frustradas, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1914, mas não chegou a tomar posse, pois seu discurso foi considerado ofensivo aos imortais Oliveira Lima e Afrânio Coutinho.
Algumas Obras: Marcha Fúnebre (1892), Poemas da Morte (1901), Dias Irae (1906), Últimas Rimas (1917), Mortalhas – Os Deuses de Ceroula (1924 – póstumo).

ÚLTIMOS VERSOS

A arte, amigo, em noss'alma só se interna
Por caminho em que o uso é um empecilho,
É a dor, a eterna dor, a estrada eterna
Que eu, entre versos, pés sangrando, trilho,

Quantas vezes o atro fundo da cisterna
A água que dela sai mostra no brilho
É o fulgor de uma lágrima paterna
A refletir a imagem de um mau filho.

in: Esparsos e Inéditos
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AGOSTO

LUÍS NICOLAU FAGUNDES VARELA, poeta brasileiro, nasceu em Santa Rita do Rio Claro/RJ a 17 de agosto de 1841 e faleceu em Niterói/RJ a 18 de fevereiro de 1875. Entrou para a Faculdade de Direito de São Paulo, mas não concluiu o curso devido sua vida boêmia. Sua poesia teve várias fases: patriótica, lírica e religiosa. Somente depois de sua morte, a crítica reconheceu seus poemas elegíacos e a qualidade de sua literatura.
Algumas Obras: O Estandarte Auriverde (1863), Vozes da América (1864), Cantos e Fantasias (1866), Cantos Meridionais (1869), Cantos do Ermo e da Cidade (1869).

SONETO

Eu passava na vida errante e vago
Como o nauta perdido em noite escura,
Mas tu te ergueste peregrina e pura
Como o cisne inspirado em manso lago,

Beijava a onda n’um soluço mago
Das moles plumas a brilhante alvura,
E a voz ungida de eternal doçura
Roçava as nuvens em divino afago.

Vi-te; e nas chamas de fervor profundo
A teus pés afoguei a mocidade
Esquecido de mim, de Deus, do mundo!

Mas ai! cedo fugiste!... da soidade,
Hoje te imploro desse amor tão fundo
Uma idéia, uma queixa, uma saudade!

in: Vozes da América
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ORAÇÃO

Do português Oração,
Do espanhol Oración,
Do francês Oraison,
São derivados do séc. XII a XIV do eclesiástico Oratio, cedo popularizado na acepção religiosa. O mesmo que: discurso proferido pela boca, rezar, ler em voz alta, citar, que se obtém pela prece, rogar, suplicar. Segundo às perspectivas, através da oração, o homem é feito sujeito diante de Deus.

PAI NOSSO (EM GUARANI)
ORE RU

Orê ru, yvagape reimeva,
Tonhembojeroviákena nde rera,
Taoreanhuambá ne mborayhu,
Tojejapo ne rembipota ko yvy ári
yvagapeguaicna.

Eme’emo oréve ko ára kóavape,
Orê rembiurã opá ára roikoteveva.
Eheja reikena orêve orê mba’ê vaikuê
Rohejá re’haichá orê rapichápe hembiapô
vaikuê.
Anikena oremoingétei
Rojepy’á ra’ã vai haguame,
Há orê peákena m’baê pochy pogýgui.
Taupéicha.
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LETRAS


COM QUE ROUPA?

Agora vou mudar minha conduta
eu vou pra luta
pois eu quero me aprumar.
Vou tratar você com força bruta
pra poder me reabilitar
pois esta vida não está sopa
e eu pergunto: com que roupa,
com que roupa eu vou
ao samba que você me convidou?

Seu português agora deu o fora.
Já foi-se embora
e levou seu capital.
Esqueceu quem tanto
amou outrora
foi no Adamastor pra Portugal
pra se casar com a cachopa

Eu hoje estou pulando como sapo
pra ver se escapo
desta praga de urubu.
Já estou coberto de farrapo
eu vou acabar ficando nu.
Meu paletó virou estopa
eu nem sei mais com que roupa,
com que roupa que eu vou
ao samba que você me convidou?

Agora já não ando mais fagueiro
pois o dinheiro
não é fácil de ganhar
mesmo sendo um cabra trapaceiro
não consigo ter nem pra gastar.
Eu já corri de vento em popa
mas agora com que roupa,
com que roupa, eu vou
ao samba que você me convidou?

NOEL ROSA
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HERMANOS

SONETO XXXVII

Ayer naciste, y morirás mañana.
Para tan breve ser, quién te dió vida?
Para vivir tan poco estás lucida,
y para no ser nada estás lozana?

Si te engañó tu hermosura vana,
bien presta la verás desvanecida,
porque en tu hermosura está escondida
la ocasión de morir muerte temprana.

Cuando te corte la robusta mano,
ley de la agricultura permitida,
grosero aliento acabará tu suerte.

No salgas, que te aguarda algún tirano;
dilata tu nacer para tu vida,
que antecipas tu ser para tu muerte.

LUIS DE GÓNGORA


LUIS DE GÓNGORA Y ARGOTE (1561 – 1627). Foi ordenado sacerdote aos 56 anos, sendo capelão. Sua obra poética inclui sonetos, romances e peças longas de severa arquitetura, e é articulada numa sintaxe complexa, com riqueza de vocabulário e de construções metafóricas, que valeram ao autor a acusação de hermetismo e obscuridade. Foi admirado por Cervantes sendo chamado de "o Homero espanhol".
Algumas Obras: Fábula de Polifemo e Galatéia (1612), Soledades (1613), entre outras.
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MULHER

QUE PENSAS?

Que pensas agora, que dor tão profunda
As fibras do peito me vem estalar?
Talvez de saudades tu'alma se inunda,
Que a vida passada te faz recordar!

Também esta mente saudosa delira,
Que flor da tristeza só vem oscular,
Em pranto dorido minh' alma suspira
Sonhando contigo num doce lembrar.

As juras sagradas que em tão meigo enleio
Juraste é a fala convulsa d'amor,
Ainda palpitam aqui neste seio,
Qu' enluta amargoso, pungente tristor!

E sempre a lembrança da louca ternura
Abrasa a minh'alma de longa paixão,
Que desse passado, rosal de ventura,
Eu tenho o perfume no meu coração!

Ai doces momentos em férvido pranto,
Te digo chorando bem trêmulo - adeus...
Ai doces momentos, d' enlevo tão santo,
Ai vida d' amores tão puros, meu Deus!

(Porto Alegre, 8 de outubro de 1856)

RITA BARÉM DE MELO
(1840-1868)
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PoetaS PortugueseS

SER POETA

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de ouro e cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma e sangue e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda gente!

FLORBELA ESPANCA

FLORBELA DE ALMA DA CONCEIÇÃO ESPANCA, nasceu em Vila Viçosa a 8 de dezembro de 1894 e faleceu em Matosinhos a 8 de dezembro de 1930. De grande personalidade poética, foi autora de sonetos parnasianos que têm a exaltada sinceridade de uma confissão.
Algumas obras: Livro das Mágoas (1919), Livro de Sóror Saudade (1923), Charneca em Flor (1931 – obra póstuma), As Máscaras do Destino (1931 – contos – obra póstuma), O Dominó (1931 – contos – obra póstuma).
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ERÓTICA

INSPIRAÇÕES DO CLAUSTRO (fragmentos)

Aqui – já era noite. . . eu reclinei-me
Nas moles formas do virgíneo seio:
Aqui – sobre ela eu meditei amores
Em doce devaneio.

Aqui – inda era noite. . . eu tive uns sonhos
De monstruosa, de infernal luxúria:
Aqui – prostrei-me a lhe beijar os rastros
Em amorosa fúria.

. . .

Aqui – era manhã. . . via-a sentada
Sobre o sofá – voluptuosa um pouco:
Aqui – prostrei-me a lhe beijar os rastros
Alucinado e louco.

. . .

Aqui – oh quantas vezes!. . . eu a tive
Unida a mim – a derreter-se em ais:
Aqui – ela ensinou-me a ter mais vida,
Sentir melhor e mais.

Aqui – oh quantas vezes!. . . eu a tive
Em acessos de amor desfalecida!
Lasciva e nua – a me exigir mais gostos
Por sobre mim caída!

JUNQUEIRA FREIRE
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FÁBULA

O URSINHO E AS ABELHAS

Um ursinho que gostava muito de pintar telas, andava curioso pelo bosque, quando viu um buraco no tronco de uma árvore.
Olhando bem, percebeu que naquele buraco havia um vaivém contínuo de abelhas. - O que fazer?
Algumas delas, batendo as asas, giravam em volta do buraco como se estivessem de sentinela; outras, vindas de longe, entravam; algumas saíam e desapareciam no bosque. O ursinho, sempre curioso, esticou-se e pôs o focinho no buraco; farejou e depois enfiou uma das patas lá dentro. Quando a retirou, vinha escorrendo mel. Mal havia começado a lambê-la, saiu do buraco uma nuvem de abelhas furiosas que se lançaram sobre ele picando o nariz, o focinho, as orelhas . . .
O ursinho tentou se defender, mas as abelhas sempre voltavam. Furioso, tentou se vingar correndo atrás de uma ou outra, mas não conseguiu se vingar de nenhuma; por fim rolou na terra, vencido pelo terror e pelas picadas, e correu chorando para junto da mãe.
Nunca se deve meter o focinho onde não é chamado!
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ORIENTE

A LOJA DE DEUS
Conto Oriental Tradicional

Entrei numa loja e vi um senhor no balcão. Maravilhada com a beleza da loja, perguntei:
- Senhor, o que vendes aqui?
- Todos os dons de Deus.
- E custa muito? Voltei a perguntar.
- Não custa nada, aqui tudo é de graça.
Contemplei a loja e vi que havia jarros de amor, vidros de fé, pacotes de esperança, caixinhas da salvação, muita sabedoria, saúde, fardos de perdão, pacotes grandes de paz e muitos outros dons de Deus. Tomei coragem e pedi:
- Por favor, quero o maior jarro de amor de Deus, todos os fardos de perdão, um vidro grande de fé, muita saúde, esperança, bastante felicidade e salvação eterna para mim e toda minha família.
Então o senhor preparou tudo e entregou-me um pequenino embrulho que cabia na palma de minha mão. Incrédula, disse:
- Mas como é possível estar tudo que pedi aqui?
Sorrindo, o senhor me respondeu:
- Minha querida irmã, na loja de Deus não vendemos frutos, só as sementes. Plante-as! Plante essas sementes, cultive-as no coração e distribua-as gratuitamente ao próximo.
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LENDAS INDÍGENAS

MARAÍ

Maraí, uma jovem e bela índia, muito amava a natureza. À noite ficava a contemplar a chegada da Lua e das estrelas. Nasceu-lhe, então, um forte desejo de tornar-se uma estrela. Perguntou ao pai como surgiam aqueles pontinhos brilhantes no céu e, com grande alegria, veio a saber que Jacy, a Lua, ouvia os desejos das moças e, ao se esconder atrás das montanhas,
transformava-as em estrelas.
Muitos dias se passaram sem que a jovem realizasse seu sonho. Resolveu então aguardar a chegada da Lua junto aos peixes do lago. Assim que esta apareceu, Maraí encantou-se com sua imagem refletida na água, sendo atraída para dentro do lago, de onde não mais voltou.
A pedido dos peixes, pássaros e outros animais, Maraí não foi levada para o céu. Jacy transformou-a numa bela planta, ganhando o nome de Mumuru, a vitória-régia.
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NOVOS

IMPRECAÇÃO

Por que me deste
um barco tão pequenino
para um mar tão grande assim?

Sem remo sem vela
sem roteiro e sem bonança
não terá praia nem fim

Se ao menos o meu barquinho
pudesse ser ancorado
num grão de areia sequer

Mas onde está essa ilha
que vai sumindo de vista
à vista do meu batel?

Quando me fizeste ao largo
não viste que minha frota
era papel?

Como queres que eu navegue
por esse mar tenebroso
numa lembrança de barco?

Pois agora lá de cima
manda uma ilha fincada
numa âncora de luz

O mar não será tão grande
nem o barco tão pequeno
no horizonte sem fim

ANDERSON DE ARAÚJO HORTA
(1906 – 1985)
Brasília/DF
in: Invenção do Espanto
Edições Galo Branco
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CABEDELO

Há muito, já, que caminho.
Há muito que me demoro
neste barro quente e duro
por onde andar virou sina.

Andar, dizer-se em fadiga,
quando a sede ainda é nada
significa perder-se
depois de surgida a casa.

Eu ando pelo objeto
de caminhar e saber-se
caminhador sem fronteira.
eu ando pra que não chegue

o lugar que desconheço.
Eu ando como encantado
à margem desabitada
e escura do rio primeiro.

Eu ando como um menino
em busca de um sol inteiro.

BENILSON TONIOLO
Campos do Jordão/SP
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IMPURO POEMA

Poesia trafega
na contramão
do estabelecido.

Por vezes singra
em versamorosidades.

Noutras encontra
(o)dores & secreções.

Suja ou casta
iconoclasta
poesia nutre-se da vida.

RICARDO MAINIERI
Porto Alegre/RS
in: www.mainieri.blogspot.com
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POEMA Nº 9

Para Henriqueta Lisboa

Sou
girassol girando em
torno da sua boca;
e a sonora harmonia
do universo.
Sou
a gota do orvalho
que some com o sol.
Sou
roteiro das surpresas
onde irei encontrar
o definitivo da vida.
Sou
um poema forte, viril,
duro, despido e afirmado.
Sou
folhas do calendário
despregando todos os dias.
Sou
a dimensão perante
o mundo e o universo.
Sou
vento gritando
as maldições do tempo.
Sou
um besouro cego
teimando sobre um
quadro na parede.
Sou
a oscilação de uma emoção;
a certeza de vê-la na tela
da vida.
Sou
desespero da consciência
onde meu pensamento
irá rasgar o tempo.
Sou
pedaço da solidão
entre as pedras
ignoradas que
o tempo esqueceu.
Sou
a intensidade dos
raios solares onde
irei envolver
sua sombra.

LUIZ FERNANDES DA SILVA
João Pessoa/PB
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PUREZA

As luzes se apagaram de repente.
E redescubro, em plena noite urbana,
o céu de minha infância.

Lírico céu noturno,
céu lavado de chuva, céu telúrico.
Estrelas, altas estrelas,
e ao nível de meu gesto os pirilampos.
Odor de terra e mato.
Sarapatel de sons: corujas, grilos, sapos.
Intimidades de capim e orvalho.
O gosto
bom de uma argila ainda não corrompida.

ANDERSON BRAGA HORTA
Brasília/DF
in: Cronoscópio
Civilização Brasileira/Pró-Memória
Instituto Nacional do Livro
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CENÁRIO TEATRAL

Nos becos os sonhos escondidos transmutam-se.
E riscamos Cinderelas, cavalos brancos e príncipes.
O cachorro companheiro espreita pedindo afeto
e caminhamos de sapatos sujos, rotos,
amargando o frio das ruas.
A noite vai e volta e o dia não nos ilumina.
Embolados em jornais ou cobertos em trapos,
montamos um cenário teatral,
escondidos nas sucatas de automóveis.
Os estômagos tocam a música da fome
e se contorcem bailarinos
numa dança de revolta e oração.
Os Deuses de costas nos testam
e andarilhos, revivemos a Divina Comédia.

TERESINHA TADEU
(1941 – 2001)
Santos/SP
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FRATELLO

Ressuscitei tua
foto 3X4
em branco e preto.

Teu olhar extraviado
de cachorro pidão
aproximou o
tempo distante.

Chorei
abraçada na alegria.

Fechei a gaveta
silenciei falando.

ZAIRA CANTARELLI
Porto Alegre/RS
in: Estalo nº 4
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PICASSO

Rosto liberto
da moldura
das feições
Concavidades
de convexas
aflições
Caos
na tauromaquia dos traços
de acrobatas pesadelos
em saltimbancos horrores
no verde-gris de Guernica.

LUIZ ANTÔNIO MARTINS PIMENTA
(1942 – 2004)
Santos/SP
in: Catedrais
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USE - ME

Não, não atente para o que digo
capte nas entrelinhas do meu silêncio,
meu mais capcioso silêncio,
é sempre ele que fala por mim.
Não, não atente par o que digo,
veja o que faço
o que tenho feito
e o que deixo de fazer.
Não, não atente para o que digo.
veja pra onde levam meus passos.
Palavras são de dizer, intencionais ou não.
Palavras ficam ou vão
se dissipam no tempo
que me interessa é o ato
esse sim é perene
indelével
a palavra é de todos
o sentimento é de um só
um unicamente.

Sim, use-me em ti
Objeto direto
Abstração do concreto
Língua e lábios,
Labirinto, palavras.
Use-me
Até que eu perca os sentidos
Os cinco
Cínicos
Oníricos, lirismo gestual
Use-me sem sentido
Sentindo
E eu uso-te são
tesão.

BEBEL MENDONÇA (Campinas/SP)
LEANDRO LUIZ RODRIGUES (Santos/SP)
in: www.mandandobrasa.blogspot.com
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CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

O poeta morreu
enquanto eu estava na rua.
Morreu e pronto.
Quando voltei já estava morto
sem que eu pudesse esboçar
a mínima reação
a tão insólita idéia.
O poeta morreu
enquanto eu estava na rua
desprevenido que estava.
Morreu sem deixar um aviso,
um bilhetinho na porta,
um adeus que fosse
ou coisa que o valha.
O poeta morreu e pronto.
O poeta morreu no Rio de Janeiro
enquanto eu jantava despreocupado
num restaurante em São Paulo.
Morreu sem licença poética.
Nem minha nem do Presidente.
É que, talvez, estivesse cansado de ser poeta.
Mas, também, não precisava sair assim,
à francesa,
só porque já tinha feito tudo,
sido o melhor,
quitado o assunto.
O poeta morreu e pronto.
O poeta morreu e pranto.

SERGIO ANTUNES
São Paulo/SP
in: www.sergioantunes.art.br
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LIÇÕES DE CASA

- E é isso então o amor, irmãos?

Não, o amor também é lampião longe no mar
é vela acesa pagando promessa
e talvez por ignorância e sem pressa
o amor é só amor, simples como o ar
nas pessoas que vivem a amar

E o amor está ali na sopa fumegando
no botão bem pregado
no chá pro resfriado
na pomada e nas gavetas
na água para as plantas
no brilho das panelas
na vassoura e nos panos
nos cabelos penteados
nas cartas nos selos
em tudo está ao nosso lado
o amor, coisa dos humanos

DOMINGOS PELLEGRINI
Londrina/PR
in: O Tempero do Tempo
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como pássaros
alijados de vôo
meus sonhos
ancoram nas pedras
criam crostas
cascas
depois descamam
feito pele
feito pó

mas sempre acabam
espalhados pelos céus
no revôo do vento
no refugo da fé

EUNICE MENDES
Santos/SP
in: Cerimônia das Flores
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CASA

. . . Antonia tinha vida, apesar de não saber. . . Cozia, cozia, cozia. Na casa, esperava Pedro ou João. Não importava. Todo o resto tinha ficado num retrato na parede. . .

WALMOR DARIO SANTOS COLMENERO
São Vicente/SP
in: Microcontos
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IDÉIA

Em um terreno baldio
havia lixo, lama, lágrimas.
Abandono urbano.

Vieram mãos e sementes
e coração humano.
Idéias, atitudes e urgências
brotaram no terreno baldio.

Flor que aflorou sorrisos.
Esperanças no plantio.

Que matou a fome
e adotou um nome.

Horta comunitária!

Cresceu explodindo em frutos,
a idéia solidária.

DALVA ARAÚJO
Santos/SP
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O NEVOEIRO COBRE A CIDADE

o nevoeiro cobre a cidade
que lentamente acorda na madrugada.
os pássaros ainda não regressaram
por isso as suas vozes não se ouvem.
os carros que passam lá fora
produzem o único som na cidade ensonada.
um cão levanta-se
e rebusca os caixotes.
a árvore preguiçosa agita as folhas.
progressivamente o nevoeiro
vai-se tornando cada vez mais denso
e só então começa verdadeiramente a história...
...agora cada um é por si.

FERNANDO AGUIAR
Lisboa/Portugal
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ECO

Minha voz se levanta como um dardo
mirando teus ouvidos sem pudor
e vai veloz, cantante como um bardo
para ofertar-te todo o meu amor.

Dizer que te amo já não é segredo
o Universo imenso já o sabe
Mas minha voz insiste, tão sem medo,
quer a felicidade que me cabe.

Depois...
cala-se quieta e ressentida
voltando para mim qual eco rouco
ao sentir, num segundo, entristecida,
que tu não a ouviste nem um pouco.

NEIVA PAVESI
Santos/SP
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IMOBILIDADE

Pelo vão da janela,
só um galho
seco
retorcido
- nenhuma gota de orvalho.

Pela estreita passagem,
retalho de ondas,
pedaço de mar,
só uma asa
- miragem.

Pela réstia de luz,
nem meia varanda,
nesga de chão,
só um pé
- que não anda.

Do meu ângulo oculto,
só o meu olhar
- sepulto.

REGINA ALONSO
Santos/SP
__________

OLHO MUDO

a moldura atura
o falso retrato

DINOVALDO GILIOLI
Florianópolis/SC
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Lua cheia de graça
Meus olhos te fitam
Meu pensamento vai longe.
*
Nos teus olhos negros
Duas luas-cheias vêm
Me afogar de amor.
*
Ó lua querida
Estás mais perto do que ele
Nesta noite mágica
*
Céu azul aberto
Sensação de plenitude
Tudo está tão certo!
*
Esperta rolinha
Cisca na grama o alimento
Adeus minhoquinha...
*
Não se bica todo o amor
Mas se é bem intenso
Pouco já é bastante...
*
Não sabem se voam
Ou dão pulinhos na grama
Pombas vacilantes.
*
Pétalas macias
Flores seduzem e atraem
Mãos que acariciam.

NEUSA MARIA CONFORTI SLEIMAN
Santos/SP
_________

SONETO PRETENSIOSO

Qual o grande segredo
que você esconde neste olhar
que, de tão enorme, consegue colocar
em mim: prazer, dúvida e medo?

E qual seria o grande desejo
que inunda o teu coração
que cala minha voz e canção
me deixa suspenso em seu beijo?

E qual seria a resposta
tão exata quanto definitiva
que manteria a alma viva

que dissesse do que você gosta?
Tomara que, ao pensar, enfim
você encontre a resposta em mim.

MARCELO LOPES
Guarujá/SP
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CHAMADO

Daqui
destes degraus batidos pelo vento
de rocha nua
- o cais noturno de se esperar -
daqui eu olho as ondas entrechocando-se...

Na sua voz
vibra a dos afogados
a dos perdidos
a de todos os náufragos.

Escute!
Há um S.O.S. tardio na voz do oceano
Um apelo desesperado
vindo de abismos insondáveis.
Como que um chamado...

E eu daqui
destes degraus batidos pelo vento
fito ao longe o mar
as ondas súbitas do mar
tragando, com violência
meu corpo inerte
no seu verde caos.

SÉRGIO BERNARDO
Nova Friburgo/RJ
in: Caverna dos Signos
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SONETO AO MAIOR

Maior é o sentimento que o sentido.
Maior é a solidão do que a saudade.
Maior é a precisão do que a vontade.
Maior é Deus, segundo o desvalido.

Maior é o sabichão do que o sabido.
Maior é a servidão do que a majestade.
Maior é o masoquismo do que Sade.
Maior é o meu poeta preferido.

Quem faz muito soneto, cedo ou tarde
acaba produzindo uma obra-prima,
contanto que não faça muito alarde.

Por trás da mera métrica ou da rima
esconde-se a coragem do covarde
e o medo, que jamais me desanima.

GLAUCO MATTOSO
São Paulo/SP
in: Paulisséia Ilhada – Sonetos Tópicos
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FUGAZ

Na penumbra da taberna
eles vão se embriagando
e elas, junto dos tonéis,
se encostando perna a perna,
vão logo se insinuando,
descobrindo-se dos véus.

Bêbados, olhos vidrados,
cheirando a uísque e cigarro
e com suas mãos enormes
procuram os seus agrados
como se fossem de barro
rindo seus risos disformes.

Elas, de bocas vermelhas
e azul nos olhos borrados
sem brilho, sem luz no olhar
levantam as sobrancelhas
e atiram-se aos desgraçados
ali, no escuro do bar.

Deixam os sonhos de lado
e gozam só seus momentos.
Esquecem os seus deslizes
esquecem o seu passado
e não choram seus lamentos
mas sabem: são infelizes.

DEISE DOMINGUES GIANNINI
São Vicente/SP
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INFORMAÇÃO IMPORTANTE

Além das seções da revista POETIZANDO e dos novos poetas, você poderá encontrar na revista impressa: Frases, Prosa, Biografias, Crônica, Conto e muita poesia...
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OUTRAS PUBLICAÇÕES DO SELO ARTESANIA

LIVROS:

De Eunice Mendes:

* Cerimônia das Flores
* Flores e Frutos
* Sonhares
* Aurora Gris

Valor: R$ 15,00 (cada)

* Sino dos Ventos
* Lua na Janela
* Espaços do Vazio

Valor: R$ 5,00 (cada)

* Nuvens de Sol

Valor: R$ 10,00

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De Walmor Dario Santos Colmenero:

* Um Poeta na Rua
* Memórias
* Versos Vivos
* Das...
* O Homem Natural
* A Mulher Natural
* Poeminhas
* Proverbinhos
* Expressões Impressas
* Bagagens de Ontens
* Poemas Bluseiros
* Tributo Vivo
* A Multiplicação do Nada
* Um Poeta na Itália
* Um Poeta na Espanha
* Lá Fora Adentro
* Out-Real
* Pedras no Chão
* Qualquer Semelhança... Não é Mera Coincidência...

Valor: R$ 5,00 (cada)
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FOLHAS POÉTICAS:

A Poetisa
- Modelo: A4, para xerocopiar e distribuir, edição trimestral.
Editora: Eunice Mendes

O Poeta
- Modelo: A4, para xerocopiar e distribuir, edição trimestral.
Editor: Walmor Dario Santos Colmenero
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FANZINES:

Árvore Azul
(7 edições)
Editora: Eunice Mendes

Escritos
- Modelo: Oficio 9, 4 páginas, edição bimestral.
Editor: Walmor Dario Santos Colmenero
Blog: http://www.fanzineescritos.blogspot.com/
UNIDADE: R$ 2,00
ASSINATURA ANUAL: R$ 10,00
CONTATOS: walmordario@ig.com.br
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